Pedro Sabiá (Capítulo O4)

Mas se voltarmos umas sete horas atrás, veremos que Pedro Sabiá estava sóbrio e trabalhando feito um jumento lá na funilaria. E hoje estava trabalhando sozinho, pois seu Sena tido ido a Piripiri fazer umas compras de material de trabalho.

Pensa que é pra qualquer um trabalhar ali naquela fornalha (apontou), temperatura do cão, só vento. Duvido se tem algum filha da puta que queira tomar meu lugar ali. Tem nada, seu Mundico, tem é uma merda. Não era mole, não, o que ele fazia.

Dez horas por dia pegando aquela quentura toda do forno que precisava ficar tinindo de quente, manejar aquele martelo de mais de três quilos pra cima e pra baixo e com a outra mão segurar firme os pedaços de ferro sobre a bigorna.  

Há coisa de cinco anos ele tinha esmagado a cabeça do dedo mindinho da mão esquerda, não podia mais cometer esse erro uma segunda vez. Então quando trabalhava, Pedro Sabiá era todo atento aos mínimos detalhes. Mesmo ontem quando o teco-teco de Mr. Freak Lee passou raspando a torre da igreja, ele deve ter sido a única pessoa que não levantou os olhos para o céu nem correu para o campo de aviação.

E olhe que ele havia sabido de antemão que o amigo chegaria naquele dia. Ao invés disso ele ficara ali espremido entre as chapas de flandres, fazendo candeeiros. Mais de quinhentos de uma lapada. (falar do grego que procurava um homem no meio dia).

Mas naquela sexta já na hora do almoço, se dirigindo para cara nas Areias Brancas ele não voltaria mais para a funilaria. Havia completado a cota de 500 lamparinas e não havia mais material para fazer uma para remédio. Por isso deixara logo a chave da funilaria na casa de seu Sena assim que saíra do serviço.

(*) Desenho de Pedro Sabiá por JBatista.

Ernâni Getirana (@ernanigetirana) é professor, poeta e escritor. Membro das academias APLA e ALVAL, e membro do IHGPI. Membro fundador do Coletivo P2. Autor de vários livros, dentre eles “Lendas da Cidade de Pedro II”. Escreve sábados para este portal.